Considerando que muitas sentenças estão sendo proferidas de maneira líquida, já com a planilha dos cálculos do valor da condenação, nos deparamos com a cobrança abusiva e ilegal de juros e multa sobre as parcelas do INSS. É lamentável que a Justiça do Trabalho acredite nas desfundamentadas arguições feitas pelos que defendem o INSS, quando nas suas petições pedem majoração do valor da contribuição previdenciária e trazem anexos contendo planilhas com juros e multa. Abaixo transcrevo trecho de fundamentação de
Acórdão da lavra da Juíza Relatora do processo que me refiro ao final, que dá uma aula de como é ilegal esta cobrança. Este é mais um dos “micos previdenciários” que estão sendo cobrados do reclamado, ilegalmente, repito.
Segue o trecho com nossas adaptações, mas que em nada altera o objetivo de fundamentar que a cobrança vem sendo feita de forma ilegal:
“…………..A discussão, no tema recursal em epígrafe, restringe-se à incidência de juros e multa sobre o débito previdenciário decorrente das parcelas trabalhistas, oriundas de decisão judicial, tendo o Juízo a quo aplicado o regime de competência para fins de apuração da contribuição para o INSS. As contribuições sociais ficam sujeitas aos acréscimos previstos na legislação previdenciária (juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC e multa variável), nos termos dos artigos 34 e 35 da Lei nº 8.212/91), apenas, e tão-somente, quando pagas após o vencimento da obrigação, cujo fato gerador ocorre unicamente com o pagamento de valores alusivos às parcelas de natureza remuneratória, resultante de sentença condenatória ou de conciliação homologada.
Este posicionamento está de acordo com o artigo 83 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, que dispõe acerca do procedimento a ser observado, no que diz respeito à incidência e ao recolhimento de contribuições devidas à Previdência Social, decorrentes de pagamento de direitos nas ações ajuizadas na Justiça do Trabalho, abaixo transcrito:
“Art. 83 O fato gerador da incidência da contribuição previdenciária, constitutiva do débito, é o pagamento de valores alusivos a parcelas de natureza remuneratória (salário-de-contribuição), integral ou parcelado, resultante de sentença condenatória ou de conciliação homologada, efetivado diretamente ao credor ou mediante depósito da condenação para extinção do processo ou liberação de depósito judicial ao credor ou seu representante legal.”
Neste sentido é o § 3º, do artigo 132, da Instrução Normativa MPS/SRP Nº 3, de 14 de julho de 2005, publicada no DOU de 15/07/2005, que dispõe sobre normas gerais de tributação previdenciária e da arrecadação das contribuições sociais administradas pela Secretaria da Receita Previdenciária – SRP e dá outras providências de seguinte teor:
“Art. 132. Serão adotadas as competências dos meses em que foram prestados os serviços pelos quais a remuneração é devida, ou dos abrangidos pelo reconhecimento do vínculo empregatício, quando consignados nos cálculos de liquidação ou nos termos do acordo.
§ 1º Quando, nos cálculos de liquidação de sentença ou nos termos do acordo, a base de cálculo das contribuições sociais não estiver relacionada, mês a mês, ao período específico da prestação de serviços geradora daquela remuneração, as parcelas remuneratórias serão rateadas, dividindo-se seu valor pelo números de meses do período indicado na sentença ou no acordo, ou, na falta desta indicação, do período indicado pelo reclamante na inicial, respeitados os temos inicial e final do vínculo empregatício anotado em CTPS ou judicialmente reconhecido na reclamatória trabalhista.
§ 2º Se o rateio mencionado no parágrafo anterior envolver competências anteriores a janeiro de 1995, para a obtenção do valor originário relativo a cada competência, o valor da fração obtida com o rateio deve ser dividido por 0,9108 (valor da UFIR vigente em 1º.01.1997, a ser utilizado nos temos do art. 29 da Lei nº 10.522, de 2002, dividindo-se em seguida o resultado dessa operação pelo Coeficiente em UFIR expresso na Tabela Prática Aplicada em Contribuições Previdenciárias elaborada pela SRP para aquela competência.
§ 3º Na hipótese de não reconhecimento de vínculo, e quando não fizer parte do acordo homologado a indicação do período em que foram prestados os serviços aos quais se refere o valor pactuado, será adotada a competência referente à data da homologação do acordo, ou à data do pagamento, se este anteceder aquela.”
Como visto, as contribuições sociais somente ficam sujeitas aos acréscimos previstos na legislação previdenciária (juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC e multa variável), nos termos dos artigos 34 e 35, da Lei nº 8.212/91, apenas quando pagas após o vencimento da obrigação, cujo fato gerador ocorre unicamente com o pagamento.
O parágrafo único, do artigo 43, da Lei n. 8.212/90, também prevê:
“Art. 43. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social. (Redação dada ao “caput” pela Lei 8.620, de 05.01.1993)
Parágrafo único. Nas sentenças judiciais ou nos acordos homologados em que não figurarem,
discriminadamente, as parcelas legais relativas à contribuição previdenciária, esta incidirá sobre o valor total apurado em liquidação de sentença ou sobre o valor do acordo homologado. (Parágrafo acrescentado pela Lei 8.620, de 05.01.1993)” – fiz os destaques
Neste sentido, a Súmula 14, desta Corte, com seguinte teor:
“CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. MOMENTO DE INCIDÊNCIA DE JUROS E MULTA.A hipótese de incidência da contribuição social prevista no artigo 195, inciso I, alínea “a”, da Constituição da República Federativa do Brasil ocorre quando há o pagamento ou o crédito dos rendimentos de natureza salarial decorrentes do título judicial trabalhista, razão pela qual, a partir daí, conta-se o prazo legal para o seu recolhimento, após o que, em caso de inadimplência, computar-se-ão os acréscimos pertinentes a juros e multa mencionados na legislação ordinária aplicável a espécie.”
Não há, portanto, que se cogitar de incidência de juros ou multa antes do pagamento do crédito principal, como, aliás, já decidido pelo Plenário desta Corte, ao apreciar incidente de uniformização, originando a Súmula 14.
A fim de que se evitem futuras digressões desnecessárias, verifico que, recentemente, por intermédio da Medida Provisória n. 449/2008, no parágrafo 2º, do artigo 43, da Lei 8.212/91, foi “estabelecido” que o fato gerador das contribuições sociais considera-se ocorrido na data da prestação do serviço, em nova violação à Carta Constitucional, e ao processo legislativo.
O Supremo Tribunal Federal já declarou inconstitucionais o parágrafo único, do Decreto n. 1.569/77, e os artigos 45 e 46, da Lei n.8212/91, que tratavam de prescrição e decadência de crédito tributário, editando a Súmula Vinculante n. 8. E o fundamento adotado, pela Suprema Corte, foi devido ao fato da matéria relativa a prescrição e decadência de crédito tributário dever ser tratada, necessariamente, por intermédio de Lei Complementar, como reza o artigo 146, inciso III, da Constituição Federal. Precedentes: RE 560.626, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 12.06.2008; RE 556.664, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 12.06.2008; RE 559.882, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 12.06.2008; RE 559.943, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 12.06.2008; RE 106.217, rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 12.09.1986; RE 138.284, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 28.08.1992.
E, de acordo, justamente, com o mesmo dispositivo de lei, é matéria afeta à lei complementar, também, a “definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes” (art.146, III, “a”, da C.F).
Registre-se que, pelos julgamentos da Suprema Corte, antes citados, as contribuições previdenciárias têm natureza tributária e, por isso, se submetem ao regime jurídico-tributário previsto na Lei Maior.
Aliado a isto, em consonância com o artigo 62, da C.F., somente em casos de relevância e urgência, o Chefe do Poder Executivo poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, submetendo-as, de imediato, ao Congresso Nacional, sendo, no entanto, vedada a edição de MP sobre matéria reservada a lei complementar (§1º, inciso III, do art.62, CF).
À sua vez, o §2º, do artigo 62, da Carta Constitucional, consigna que, “medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada”, sendo vedado, em consonância com o artigo 150, incisos I e III, da C.F., à União, aos Estados, Municípios e DF, “exigir ou aumentar tributo sem que lei o estabeleça”; “cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado”; “ cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu” ; cobrar tributos antes de decorridos 90 dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou” ; “instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros”
É certo que a vedação do inciso III, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I. (NR) (Redação dada ao parágrafo pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003, DOU 31.12.2003, com efeitos a partir de 45 dias da publicação).
Contudo, dentre tais exceções, não estão abrangidas as contribuições previdenciárias, pois:
a) o artigo 148, I trata sobre despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência:
b) no artigo 153, I a V, os impostos são os que decorrentes de:
I – importação de produtos estrangeiros;
II – exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;
III – renda e proventos de qualquer natureza;
IV – produtos industrializados;
V – operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;
c) o artigo 154, II, trata de iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.
d) no art.155, III, a matéria versa sobre imposto sobre veículos automotores;
e) o art.156, I, trata de PTU.
Registre-se, ainda, que há possibilidade, da União instituir impostos não previstos no artigo 153, desde que não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios discriminados na Constituição, mas, ainda assim, sempre, por intermédio de lei complementar, como giza o artigo 154.
E, especificamente, em relação às contribuições previdenciárias, de acordo com o §4º, do artigo 195, da C.F, a lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no artigo 154, I, isto é, sempre, por meio de lei complementar.
Acerca, ainda, da competência, relativamente às contribuições previdenciárias, o Excelso Supremo Tribunal Federal, apreciando o Recurso Extraordinário RE 569056, interposto pelo INSS, por unanimidade, considerou correto o entendimento sedimentado na Súmula n. 368, do C.TST .
O eminente Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, consignou, em seu voto, que a execução das contribuições previdenciárias, pela Justiça do Trabalho, “limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores objeto de acordo homologado, que integram o salário-de-contribuição, excluída a cobrança das parcelas previdenciárias decorrentes de todo período laboral”, pois, “o que se executa não é a contribuição social, mas o título que a corporifica ou representa, assim como o que se executa, no juízo comum, não é o crédito representado no cheque, mas o próprio cheque.”
Pois, consoante Sua Excelência: “o requisito primordial de toda a execução é a existência de um título judicial ou extrajudicial”, e que, “no caso da contribuição social atrelada ao salário objeto da condenação, é fácil perceber que o título que a corporifica é a própria sentença cuja execução, uma vez que contém o comando para o pagamento do salário, envolve o cumprimento do dever legal específico de retenção das parcelas devidas ao sistema previdenciário”, e que, “entender possível a execução de contribuição social desvinculada de qualquer condenação, de qualquer transação, seria consentir com uma execução sem título executivo, já que a sentença de reconhecimento do vínculo, de carga predominantemente declaratória (no caso de existência de vínculo empregatício), não comporá execução que origine o seu recolhimento. No caso, a decisão trabalhista que não dispõe sobre o pagamento de salários, mas apenas se limita a reconhecer a existência do vínculo, não constitui título executivo judicial no que se refere ao crédito de contribuições previdenciárias”
E concluiu: “O receio de que, sendo nosso sistema de previdência social contributivo e obrigatório, a falta de cobrança de contribuição nas circunstâncias pretendidas pelo INSS não pode justificar toda uma argumentação que para atingir seu desiderato viole o art. 195 da Constituição e ainda passe ao largo de conceitos primordiais do Direito Processual Civil, como o princípio da nulla executio sine titulo e do Direito das Obrigações, como os de débito e responsabilidade (schuld und haftung) que, no Direito Tributário, distinguem virtualmente a obrigação do crédito tributário devidamente constituído na forma da lei.Com base nas razões acima deduzidas, entendo não merecer reparo a decisão do Tribunal Superior do Trabalho no sentido de que a execução das contribuições previdenciárias está no alcance da Justiça Trabalhista, quando relativas ao objeto da condenação constante das suas sentenças, não abrangendo a execução de contribuições previdenciárias atinentes ao vínculo de trabalho reconhecido na decisão, mas sem condenação ou acordo quanto ao pagamento das verbas salariais que lhe possam servir como base de cálculo.”
Proc. TRT nº 01712.2008.012.06.00.9 (RO) Juíza Relatora: Ana Catarina Cisneiros Barbosa de Araújo
Fonte: marcosalencar.com.br